sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Mais previsibilidade e menos custo nos encargos de energia

Estima-se que os custos dos consumidores de energia com a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) possam subir em torno de 120% em 2015 e ainda mais nos próximos anos. No curto prazo, esse temor da indústria grande consumidora de energia se deve ao fato de o Tesouro Nacional ter indicado que vai reduzir sua participação no montante de recursos previsto para o ano que vem.

A preocupação em relação aos anos seguintes, por sua vez, é porque não há garantia de que os desembolsos do órgão continuem ocorrendo. Toda essa incerteza prejudica não só as condições de planejamento das indústrias, como ameaça a competitividade dos próprios negócios dessas companhias, uma vez que o custo da energia elétrica corresponde à parcela significativa dos gastos totais de produção. E o aumento do encargo soma-se a outros custos crescentes: hoje os preços da energia estão cerca de três vezes mais elevados no mercado livre do que há dois anos e os custos de transmissão subiram quase 70% apenas neste ano. O atual formato da CDE foi definido em meados de 2012, com a publicação da Medida Provisória 579 (que também estabeleceu regras para renovação das concessões de geração e transmissão).

Denominado por alguns de “superconta”, o encargo passou a englobar despesas como o custo dos combustíveis das térmicas dos sistemas isolados do Norte do país, anteriormente pagos pelos consumidores diretamente nas contas de energia sob a rubrica da Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), além dos custos de estímulo a fontes alternativas de energia e universalização, entre outros anteriormente sob sua responsabilidade. É preciso criar um programa que considere a energia como um instrumento de política industrial.

No que se refere às receitas, a CDE agrega recursos de naturezas diversas e pode – ou não – contar com o aporte de recursos do Tesouro Nacional. Tais aportes foram prometidos também no lançamento da MP, que determinou que os custos de políticas públicas até então desenvolvidas com recursos da conta de energia dos consumidores passariam a ser custeados pelo Tesouro. A projeção de aumento da conta em 2015 considera a manutenção das despesas no mesmo nível deste ano – R$ 18 bilhões – e a sinalização (ainda não confirmada), do Tesouro Nacional, de que aportará R$ 9 bilhões ao fundo – R$ 2,8 bilhões a menos do que o verificado em 2014. Com isso, estima-se que poderá haver um custo adicional para todos os consumidores da ordem de R$ 2,1 bilhões. Na prática, isso representará um aumento do encargo para R$ 10,44 por MWh para os consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, e de R$ 2,31 por MWh para os do Norte e Nordeste. Para os primeiros, esse custo é maior até que os gastos atuais com transmissão de energia.

A situação dos consumidores em relação ao encargo ficará ainda mais complicada se a promessa deixar de ser cumprida e não houver aporte de montante algum de recursos do Tesouro na CDE: estudos preparados para a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) apontam que a conta pode subir mais de R$ 14 bilhões em um único ano. Nesse cenário, os consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste pagariam um encargo da ordem de R$ 40 por MWh, quase dez vezes maior que o atual. Existem, porém, alternativas que se complementam para lidar com esse problema. A primeira refere-se à previsibilidade.

O Tesouro poderia publicar um orçamento (e um compromisso) plurianual de aporte de recursos à conta. Em conjunto com projeções da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para as despesas no mesmo horizonte de tempo, haveria uma informação mais concreta sobre qual será o valor pago pelos consumidores nos próximos anos, viabilizando o planejamento orçamentário e até mesmo de investimentos.

A segunda alternativa trata do aumento da eficiência das despesas pagas pela CDE. É preciso que se avalie onde há espaço para economia, em itens como a Conta de Consumo de Combustíveis e outros subsídios. Por fim, é preciso criar um programa que considere a energia como um instrumento de política industrial que, a exemplo do que se pratica em grandes economias concorrentes, como França, Canadá e Alemanha, isente a indústria do pagamento de encargos e/ou lhe destine energia em condições mais competitivas como forma de desoneração de seus custos de produção.

Trata-se de uma visão de política em que se prioriza a energia àqueles consumidores que poderão agregar maior valor a ela. Vale lembrar que diversos estudos demonstram que a alocação de energia em condições competitivas à indústria grande consumidora tem impactos no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) muito superiores à alocação do insumo a consumidores para os quais o custo energético é menos relevante. Num contexto em que grandes indústrias têm sua competitividade afetada pela elevação dos custos da energia, sobretudo no mercado livre, a discussão sobre o problema da CDE não pode esperar, especialmente quando parte da solução passa por ampliar o nível de transparência e a eficiência na gestão das despesas pagas com recursos do encargo. A CDE não precisa e não pode ser uma surpresa para a indústria a cada virada de ano. (Valor Online)
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