terça-feira, 30 de abril de 2013

Eficiência é a nova palavra chave no cenário pós MP 579

Os efeitos da MP 579 deverão ser sentidos no setor ao longo dos próximos dois anos. Convertida em janeiro na Lei nº 12.783, a MP trouxe novas regras para concessões de ativos que expirariam entre esse ano e 2017 e que representam 20% do parque gerador nacional, 67% do sistema de transmissão e 36% da área de distribuição. Para se adequar ao novo cenário de preços mais baixos, as empresas terão que buscar redução de custos e maior eficiência. "As empresas terão de se adaptar a esse novo quadro, o que exigirá iniciativas detalhadas de corte de custos. Podemos ver um avanço da consolidação no setor, já que mais escala significa mais economia. Grupos verticalizados, com equilíbrio na parte regulada e não regulada, também saem na frente", diz o diretor da LCA Consultores, Fernando Camargo. 

Maior holding do setor elétrico, a Eletrobrás anunciou, em março, seu Plano Diretor 2013-2017, prevendo melhorias da eficiência operacional e reestruturação do modelo de negócios, governança e gestão. Prevê um corte de 20% do orçamento de materiais, serviços e outras despesas para todas as empresas do grupo nesse ano. Essa medida, juntamente com outras em elaboração, potencializarão uma redução do custeio de 30% nos próximos três anos, nos cálculos da empresa. No fim de junho, deve ser apresentado um plano de reestruturação dos negócios de distribuição da empresa, o que pode incluir a venda de participação nos ativos dessa área, que são deficitários. Em paralelo, a estatal, cujo controlador é a União, trabalha em um Programa de Demissões Voluntárias (PDV), que prevê contar com cerca de cinco mil adesões nesse ano. 

"O mercado estará com lupa sobre a Eletrobrás e como ela fará essa virada operacional", afirma Camargo. Nos últimos anos, as subsidiárias da empresa contribuíram para a redução dos custos de construção das hidrelétricas na região Norte. Com menos caixa por conta da nova regulação, em que as empresas passam apenas a fazer a operação e manutenção dos ativos de geração, ganhando cerca de R$ 20 o MWh ante os R$ 90 MWh observados na legislação anterior, fica a incerteza de como será o preço dos novos projetos hídricos. "As empresas do grupo poderão não ser tão agressivas, o que pode colocar pressão sobre o custo da geração dessas usinas a serem construídas nos próximos anos, ainda mais em um momento em que a energia térmica ganha espaço." 

A Cemig, outra afetada pela nova regulação, também sofreu o impacto nesse início do ano da terceira revisão periódica realizada no setor de distribuição. Controlada pelo governo mineiro, a holding já está em meio a um processo de revisão de processos e corte de custos para se adequar à nova realidade. Na área de distribuição, os custos operacionais estão em cerca de R$ 2 bilhões, enquanto a empresa de referência usada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) na revisão está em R$ 1,7 bilhão. "Estamos no desafio de cortas custos e ter mais eficiência", disse o diretor de relações de investidores, Luiz Fernando Rolla, em recente teleconferência. 

No início de 2012, já de olho nos impactos da revisão periódica de tarifas das distribuidoras, a empresa divulgou comunicado ao mercado informando conduzir estudos que indicavam oportunidades de redução de custos que poderiam chegar a R$ 600 milhões para os próximos três anos. Após a MP 579, a empresa deverá aumentar esse valor. 

A Cemig abriu, em março, um PDV que deve contar com mil adesões. Na área de geração, a empresa se prepara para uma briga jurídica, por não ter aceitado as regras estipuladas pelo governo em relação a três ativos que venceriam entre 2013 e 2017. A decisão da União afetou, principalmente, as concessões de três importantes usinas hidrelétricas da empresa - São Simão (1.710 MW), Jaguara (424 MW) e Miranda (408 MW), responsáveis por pouco mais de um terço da capacidade instalada em geração. 

Recentemente, a empresa solicitou a renovação automática da usina de Jaguara, cujo prazo de concessão expiraria esse ano. Há duas semanas, a diretoria da Aneel recomendou que não fosse prorrogada em virtude das novas regras do setor. Tudo indica que a decisão irá parar na Justiça. A Cemig acredita ter direito à renovação automática desses ativos. Em 1997, quando a AES tinha participação na empresa, foi feito um contrato, assinado pelo então ministro de Minas e Energia, Raimundo Brito, no qual estipulava que, em sua cláusula quarta, esses três ativos seriam renovados automaticamente entre 2015 e 2017. 

"Há 16 anos foi feito esse contrato e não se falou nada a respeito dele, o que cria uma estabilidade jurídica", disse a diretora jurídica da empresa, Maria Celeste Guimarães, em recente teleconferência. Outro ponto da argumentação da empresa é que o artigo 21 da Constituição expõe que ativos hidroelétricos têm de ser renovados com uma ampla articulação entre União e Estados. "O recente parecer da ministra do STF, Carmem Lucia, sobre a manutenção dos contratos antigos na discussão dos royalties do pré-sal é outro ponto a nosso favor." 

Enquanto não se tem uma decisão final sobre o assunto, a estatal mineira está preparada para crescer no mercado de gás, de olho nos leilões de gás não convencional, e em oportunidades na área de geração. "Iremos buscar ser competitivos nos leilões de energia nova reduzindo o custo de investimento", disse Rolla. A empresa encerrou ano passado com R$ 4 bilhões em caixa, o que permite tanto a gestão dos ativos quanto à busca de oportunidades que eventualmente surgirem. A estatal terá de devolver, daqui a dois anos, 15 ativos de geração por não ter aceitado as regras do governo. Assim trabalha na substituição dessas usinas. "Aquisições de novos ativos de geração estão em negociação. Tem algumas oportunidades que são bastante atrativas", afirmou Rolla. 

Enquanto as empresas se movimentam, os investidores se mantêm cautelosos. Dois gestores de grandes fundos internacionais estão distantes do setor, tradicional pagador de altos dividendos. "Estamos olhando outros setores de infraestrutura, como rodovias e saneamento, porque há muitos desafios para as elétricas, que terão de mostrar nos próximos dois anos que conseguirão reduzir custos e manter a lucratividade", diz um gestor. "Só com resultados concretos dessas viradas, o setor poderá voltar a estar na lista de compras", diz o outro investidor. (Valor Econômico)
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