quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Dinheiro acaba e elétricas ficam com conta bilionária

Dois meses antes do previsto, acabou o dinheiro dos empréstimos de R$ 17,8 bilhões feitos por um “pool” de bancos para socorrer as distribuidoras de energia e conter os reajustes das contas de luz em 2014. Não sobrou nenhum tostão para os meses de novembro e dezembro. E a conta de outubro já está negativa em R$ 266 milhões, conforme antecipou ontem o Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor.

A situação coloca pressão ainda maior sobre as contas fiscais de 2015, já que os pagamentos relativos aos dois últimos meses deste ano serão feitos em janeiro e fevereiro, e devem ser necessários mais R$ 3 bilhões para acertar a conta. Quanto ao saldo negativo de outubro, não há solução encaminhada pelo governo. O mais provável é que o dinheiro, pelo menos até a virada do ano, saia do caixa das distribuidoras.

Os empréstimos ao setor elétrico foram tomados pela Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) para pagar os custos do acionamento intensivo das térmicas e da exposição involuntária das distribuidoras ao mercado de curto prazo. Elas não conseguiram contratar todas as suas necessidades de suprimento nos leilões do governo e ficaram expostas aos preços recordes do megawatt-hora no mercado “spot”.

Os recursos, que formaram uma conta específica gerida pela CCEE (Conta-ACR), são repassados mensalmente às distribuidoras. Na liquidação financeira das operações de outubro, que ocorre na semana que vem, as empresas apresentaram fatura de R$ 1,449 bilhão à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Só R$ 1,182 bilhão pode ser efetivamente liberado, desta vez, porque os recursos se esgotaram e não contemplam todas as necessidades das empresas para essa liquidação. Diante da falta de dinheiro, elas terão que arcar sozinhas com o valor restante. As informações constam de nota técnica da Aneel, que evidencia a “limitação de recursos contratados” para pagar os gastos de outubro.

As distribuidoras já levaram sua preocupação à Aneel e ao Ministério de Minas e Energia. Um novo empréstimo está descartado, bem como um aporte adicional do Tesouro Nacional, segundo fontes ouvidas pelo Valor.

De acordo com relatos do setor privado, a conta estourou por duas razões. Uma foi o tamanho do “risco hidrológico”, devido à escassez de chuvas e à queda dos reservatórios, que levou as usinas a produzir menos energia do que o definido em contratos. Quando isso ocorre, no caso das concessões renovadas no fim de 2012, as despesas com a compra de eletricidade no mercado de curto prazo são repassadas aos consumidores – e assumidas pelas distribuidoras até o reajuste seguinte.

Com o valor de R$ 822 para o megawatt-hora no mercado “spot”, as despesas cresceram acima do esperado. Outro fator de pressão veio das liminares que têm desobrigado geradoras de repor a energia de obras atrasadas.

Para resolver as pendências do último bimestre do ano, que as empresas afirmam não ter condições de assumir com caixa próprio, o foco se volta à situação da hidrelétrica de Jirau. A usina, que está em construção no rio Madeira (RO), atrasou consideravelmente sua entrada em funcionamento. Mesmo descumprindo o cronograma, livrou-se de pagar a conta pela reposição da eletricidade, já que obteve uma liminar na Justiça. Ela atribui o atraso a conflitos e greves trabalhistas, e que não foi responsável por isso.

O “excludente de responsabilidade” para Jirau vale até um julgamento do processo administrativo pela Aneel. Segundo fontes, a Energia Sustentável do Brasil (ESBR) – concessionária que constrói e opera a usina – já teria deixado de pagar R$ 2 bilhões, graças à liminar, para repor eletricidade que não conseguiu entregar.

As distribuidoras devem pressionar a agência por um julgamento ainda neste mês e acreditam na derrubada, pelo menos parcial, das alegações da ESBR. Se isso ocorrer, ela teria que acertar as contas de uma só vez, a exemplo do que ocorreu recentemente com a Santo Antônio Energia.

De qualquer forma, integrantes da equipe econômica afirmam que, do ponto de vista fiscal, não há problemas para o orçamento de 2014. Como acontecem com dois meses de diferença, as liquidações de novembro e de dezembro vão ficar apenas para o primeiro trimestre de 2015.

Quando o financiamento da CCEE foi definido, a área econômica já contava com a transferência dessa conta para o ano que vem. A aposta era que o regime de chuvas seria positivo e a conta dos meses de novembro e dezembro, bastante baixa.

O empréstimo da CCEE será pago pelos consumidores ao longo dos próximos três anos. Com isso, haverá impacto nos reajustes das tarifas de energia até 2017. Cálculos do Tribunal de Contas da União (TCU) apontam que, além de devolver o valor do empréstimo em si, os consumidores vão desembolsar juros de R$ 8,79 bilhões aos bancos envolvidos na operação. (Valor Econômico)
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