quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Energia em choque com o meio ambiente

Reconhecido historicamente como um país de produção de eletricidade limpa, o Brasil mudou de rota e, em uma década, irá lançar na atmosfera 61% mais gases de efeito estufa com a produção e consumo de energia. Com isso, o setor passará, gradativamente, a ter um peso maior no balanço nacional de emissões, uma ameaça aos avanços obtidos com a redução do desmatamento.

A projeção de crescimento da poluição proveniente da queima de combustíveis e geração elétrica é do governo, em seu estudo do desenvolvimento da matriz energética — o Plano Decenal de Energia 2022, da Empresa de Pesquisa Energética (EPE). A previsão é que as emissões saltem de 437 milhões de toneladas, em 2012, para 702 milhões de toneladas, em 2022.

O documento ressalta os esforços do governo para conter o desmatamento na Amazônia e no Cerrado, o que torna relevante a adoção de medidas de “mitigação na produção e consumo de energia” para atender ao “compromisso (ambiental) voluntário proposto pelo país”. Em seguida, a EPE ressalta que o grande desafio é “manter a elevada proporção de renováveis na matriz energética”.

“Até 2020, o Brasil conseguirá atender às exigências internacionais de redução dos gases de efeito estufa, com a queda do desmatamento. Mas, em compensação, o setor de energia passa a ter mais peso nessa conta e a ser mais preocupante”, alerta o diretor da Coppe-UFRJ, Luiz Pinguelli Rosa.

A principal ameaça continuará, na década, partindo do segmento de transporte, sobretudo, com a crescente queima de óleo diesel para a movimentação de cargas e passageiros nas rodovias nacionais. As ações do governo de incentivo ao investimento em logística terão pouco efeito para o meio ambiente, admite a EPE. “Embora sejam levadas em conta as iniciativas do Plano Nacional de Logística e Transportes (PNLT), que favorecem as reduções das emissões, como resultado da diversificação de modais, não se espera, no horizonte decenal, que essas ações alterem significativamente o quadro setorial de emissões”, traz o PDE.

Como solução, um crescimento do consumo de etanol em veículos de passeio, em substituição aos combustíveis de origem fóssil. Contudo, a própria EPE informa que não há uma disposição dos motoristas em trocar o consumo de gasolina pelo álcool, como percebido no plano do ano anterior. Por causa da política de governo de segurar os preços, a tendência é que a gasolina continue com preço mais competitivo do que o álcool.

Isso “demonstra a necessidade de encaminhamento de políticas públicas para aumento da produção e uso de biocombustíveis, tanto do etanol quanto do biodiesel”, propõe. Mas, ao mesmo tempo, aponta que, nos primeiros anos da década, a oferta de álcool combus-tível será limitada pela concorrência com a demanda externa por açúcar, que também utiliza a cana-de-açúcar como insumo.

No caso do biodiesel, a perspectiva é que a oferta seja concentrada no atendimento à exigencial legal de adição do produto ao diesel derivado de petróleo. A EPE chegou a considerar em seu estudo um cenário de aumento do consumo de biodiesel pelo setor agropecuário, em substituição ao diesel, mas concluiu que o preço da matéria-prima para a produção de biodiesel deve subir mais do que o do óleo diesel, comprometendo a competitividade do combustível de origem vegetal.

“A solução do setor de transporte passa por uma mudança na matriz dos modais. Transporte de cargas por caminhão não faz muito sentido. É necessário implantar mais cabotagem e ferrovias. Nas cidades, há muito pouco metrô”, ressalta a professora da Coppe-UFRJ Suzana Kahn.

Apesar de o setor de transporte ser o que mais emite gases de efeito estufa, a fonte que mais avançará na década no lançamento de dióxido de carbono será a térmica a gás natural. A projeção é de crescimento de 9,1% na geração térmica de 2012 a 2022, e de 3,2% na produção hidrelétrica, em igual período. Os motivos são o crescimento do número de usinas instaladas por grandes empresas para o consumo próprio e o uso crescente de térmicas em substituição às hidrelétricas, para as quais o governo não consegue licenciamento ambiental. São poucos os reservatórios hidrelétricos de grandes dimensões e a maioria deles está na região Amazônica, o que implica em prejuízos ambientais e sociais. (Brasil Econômico)
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