terça-feira, 14 de maio de 2013

Setor quer rentabilidade maior em transmissão

A ausência de ofertas para quatro empreendimentos no primeiro leilão de transmissão após a aprovação da Lei 12.783 (Antiga MP 579, da prorrogação das concessões), na sexta-feira, é um indicativo do novo cenário do mercado elétrico. Para especialistas, as empresas, principalmente a Eletrobras (a mais afetada pela lei), ainda estão analisando os efeitos da medida, aceitando menos riscos e exigindo taxas de rentabilidade mais adequadas à nova realidade. 

Dois participantes frequentes dos leilões de transmissão, o grupo Eletrobras e a Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (Cteep), que aderiram à proposta do governo de renovação onerosa das concessões, não adquiriram novas linhas na sexta-feira. A Cteep inclusive nem se inscreveu para o leilão. A fraca competição se traduziu em um deságio médio de 11,96%, considerado baixo para o histórico dos leilões da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). 

"O resultado pode indicar desajustes no modelo, pois os leilões de linhas de transmissão sempre foram um bom medidor de temperatura do ambiente regulatório", afirmou o coordenador do Grupo de Estudos do Setor de Energia Elétrica (Gesel/UFRJ), Nivalde Castro. Para ele, o leilão é repercussão dos efeitos da Lei 12.783. 

Segundo Castro, o caso da Cteep é o mais "emblemático" porque três dos quatro lotes que não receberam ofertas estão situados em São Paulo, área de forte influência da companhia. A empresa, inclusive, poderia obter ganhos de escala entre os novos projetos e empreendimentos que fazem parte de sua carteira, como o sistema de escoamento da energia das hidrelétricas do Rio Madeira (RO) para a subestação Araraquara 2 (SP). 

No mercado, comenta-se que o comando da Cteep, controlada pela colombiana ISA, está insatisfeito com o desdobramento do processo de prorrogação das concessões. Em dezembro de 2012, o conselho de administração da companhia reviu sua decisão de rejeitar a proposta do governo, com a promessa de que receberia uma indenização adicional por seus ativos, devido à reconsideração dos investimentos residuais anteriores a 2000. Até agora, no entanto, esse ponto ainda não foi regulamentado. 

"Quanto a não participação no último leilão de transmissão, a Cteep reitera que irá readequar o perfil da dívida da companhia ao novo nível de receita e aguarda também a definição sobre o valor da indenização de ativos não amortizados anteriores a maio de 2000 para a retomada de seu ciclo de crescimento", informou a empresa, em nota. 

O sócio-diretor da consultoria Tempo Giusto e ex-presidente da AES Brasil, Eduardo Bernini, chamou a atenção para outro fator de desestímulo: a baixa taxa de retorno nominal para o setor de transmissão, da ordem de 5%, o que representa um prêmio muito pequeno em relação a investimentos mais conservadores, como os títulos do Tesouro. 

"Não me parece que o governo tem sido claro ao considerar o rol de riscos de investimentos, não só em energia elétrica, mas em infraestrutura em geral, ao definir o que é a taxa mínima de atratividade", afirmou Bernini. 

A baixa taxa de retorno pode explicar a ausência no leilão de empresas que não sofreram impactos da Lei 12.783, como a gigante chinesa State Grid. A companhia, que no ano passado declarou interesse nos sistemas de transmissão de energia da hidrelétrica de Belo Monte (PA), não disputou dois lotes que fazem parte desse pacote e foram ofertados na sexta. Essas concessões foram arrematadas pelas espanholas Abengoa e Isolux. 

A State Grid, porém, informou em nota que "neste momento está focada na incorporação das concessionárias adquiridas da ACS [Actividades de Construcción y Servicios] e nos projetos que mantém com seus parceiros Furnas e Copel ". A empresa ressaltou que continua avaliando a participação em futuras oportunidades de investimentos. 

Segundo o diretor-executivo da Associação Brasileira de Grandes Empresas Transmissoras de Energia Elétrica (Abrate), César de Barros Pinto, a falta de ofertas para os lotes e a ausência de empresas no leilão "vale como um alarme para refletir sobre a regulação do setor". Ele acrescentou que o segundo leilão de transmissão do ano, cujo edital está em audiência pública, está muito próximo e não haverá tempo hábil para aperfeiçoamentos. 

Outro problema da falta de ofertas para os quatro lotes é o risco para o sistema elétrico brasileiro. De acordo com o Programa de Expansão da Transmissão (PET) 2013-2017, elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), esses empreendimentos precisavam entrar em operação entre janeiro deste ano e maio de 2015. Como o prazo de construção estimado no PET para esses projetos é de 24 meses, todos eles iniciarão a operação com atraso em relação ao marco previsto inicialmente. 

Barros, da Abrate, lembrou que, como o edital do próximo leilão já está em audiência pública, aparentemente não será possível incluir esses ativos na licitação. O diretor da Abrate, no entanto, disse que a situação ainda não chega a ser preocupante. (Valor Econômico)
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